Tuesday, April 25, 2006


maniqueísmo, s. m. Doutrina de Mani ou Maniqueau, persa do século III; por extensão, toda a doutrina que admite um principio do bem (identificado com Deus) e um principio do mal, independentes um do outro e em luta um contra o outro

In Dicionário da Língua Portuguesa, 5ª edição, Porto Editora

Caminhar entre a luz e a escuridão, entre o bem e o mal, com a presunção de ser isento, e no meio poder ambos julgar…

Hoje festeja-se a conquista da liberdade, a revolução do animal oprimido… entristeço quando oiço a desilusão dos que travaram na primeira linha essa batalha, esmoreço ao ouvir os da minha idade a falar de “liberdade a mais…” como se tal fosse possível!? A Liberdade não se quantifica…ou é total ou é outra coisa qualquer… se calhar todas as gerações deveriam passar pelo aperto de viver sob um regime fascista para poder ganhar a liberdade lutando, para lhe dar o justo valor…

Conquistado um obstáculo, deveríamos dedicar-nos ao próximo e não permanecer vangloriando-nos sobre as vitorias… se para aprendermos uma lição, necessitamos de eternamente revê-la, então não estamos a aprender. O ponto em que se dá a evolução é o breve momento em que viramos mais uma pagina…



Não temos liberdade a mais camaradas!

Há anos ouvi um mestre meu afirmar-me que a revolução pela liberdade tinha sido conseguida, faltava agora a revolução pelo respeito… talvez seja esta nossa responsabilidade… Mas não menosprezemos aquilo que custou tantas vidas de luta e sofrimento…

Os tesouros devem ser estimados, e nunca esquecidos…


Sunday, April 23, 2006


Contrastes II de II

Outra silhueta negra
De mais um juiz dos deuses
Que anota cada divino acto
E pondera cada regra
Escrita nos raios que escapam
Por entre o nublado pacto.
Perante o eterno julgamento
A avaliação distingue o bardo,
que existe por um momento,
do imenso julgado

Saturday, April 22, 2006

Contrastes I de II

Personagem una com a sombra,
Atento à malha do mundo real,
Na sua fase homogénea encontra,
O sossego para um juízo leal,
Sobre o engalfinhado panorama;
raízes procurando luz como se fosse terra,
num enredo que se adensa qual trama,
intriga que na consciência se ferra…

Thursday, April 20, 2006


Escanibabi
Ou
Uma viagem em direcção à Importância

Capítulo I

“Embarque forçado”

Do interior da obscuridade, o rapaz acordou um pouco desorientado, agarrando-se com afinco a uma dor de cabeça atordoante que o fez inclinar levemente o torso para a esquerda.
Após a dor se disfarçar de pulsação natural, este examinou entre olhos franzidos o espaço que o rodeava com cuidado – todavia, não conseguindo reconhecer nada do que via no minúsculo recinto em que acordou.
Antes de se levantar, um leve bater na única porta deste pequeno cubículo tocou a sua atenção como instinto. Segundos depois, um outro mais forte se seguiu anexo a um papel introduzido no friso inferior da porta, ao qual o rapaz se inclinou para ler, mantendo essa mesma posição.
Era um envelope selado por uma companhia de comboios, com um menu de jantar no seu interior, com diversos pratos e bebidas sobre o qual se podia assinalar em pequenos rectângulos a escolha desejada. Nenhum dos pratos tinha preço, e no fim vinha assinalado a azul a hora do jantar como 20h45, o destino como carruagem 2, e o número 19 como número de passageiro.
Mesmo antes do óbvio se insinuar no seu cérebro, o pequeno espaço abanou algumas vezes para trás e para a frente, após uma forte batida para trás.
Imediatamente o jovem afastou a cortina de uma das janelas da área, abrindo-a em sobressalto para o que aparentava ser uma gare ferroviária. Estava sem dúvida no interior de um comboio, de uma carruagem que mais parecia um estúdio ou um pequeno quarto.
Precipitou-se inconscientemente para a porta – tentando perceber o que se passava, e porque não se lembrava de nada – mas esta encontrava-se fechada.
Olhou rapidamente à sua volta, tentando encontrar a chave, mas nada do que via aparentava qualquer parecença com tal objecto; espreitou também pelo buraco da fechadura, esperando que a chave estivesse colocada do outro lado, mas nada… por esta apenas se via um tecido avermelhado – talvez veludo – firmemente agarrado e esticado no que parecia ser a parede de um longo corredor.
Voltou então a depositar a sua atenção para o compartimento, de onde do seu centro sentiu um estranho conforto, como se tudo nele lhe fosse um pouco familiar.
O compartimento era pequeno, 4 metros por 7, decorado por sons e cheiros muito para além da obrigatória mobília impecavelmente arrumada e limpa destes ambientes.
À esquerda, uma cama rente ao chão com espaço para quase duas pessoas reduzia a área do quarto, de tal modo, que uma pequena mesa de convívio quase se via obrigada a esconder – por detrás de um banco de bar – envergonhada num canto perto da janela. A janela, essa, era larga… iluminando o espaço bem para lá da natural exposição da sua luz, tocando quase todos os objectos com igual imparcialidade.
À direita encontrava-se uma longuíssima estante de manuscritos e volumes antigos – estes muito familiares – que para além de atribuírem ao local um aspecto sensivelmente austero, também reflectiam a luz para uma escrivaninha de investigação cuidadosamente trabalhada pelo requinte. Uma cadeira de madeira rotativa completava esta parte do estúdio.
Um pouco mais para a esquerda, uma minúscula porta abria o espaço desta divisão para um outro cubículo rectangular onde se encontravam as respectivas instalações sanitárias, completas com lavatório e um chuveiro, opostos a uma ventana selada, ligeiramente mais pequena que a outra janela.
Confuso, o rapaz cessou a sua infrutífera pesquisa deste espaço, desiludido por não conseguir descobrir nada que se pudesse sequer confundir com uma pista.
Nesse momento, duas sirenes anunciaram estrondosamente o começo da marcha do comboio… primeiro suavemente e depois tocado pelo ímpeto do carvão misturado com a lenha…
Esse solavanco fez cair um livro da estante, que se abriu no chão… por triste ironia, evidenciando um capítulo de auto-ajuda denominado: Como aprender através da inércia – Impedir que essas ligações que tornam as perguntas, respostas e as respostas, perguntas - se formem…




Fotos
Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação , Projecto de Manuel Tainha e Azulejos de Jorge Colaço



Um artista é e será sempre pobre… porque só os pobres se sentem incomodados ao ponto de criar novas formas de comunicar…aquela insatisfação do interior para com a envolvente…

Um artista pobre que pinta na rua… para vencer a miséria, trocando seus filhos pelos trocos que o levarão ao mesmo sitio no próximo dia, agarrado a esse propósito, que é tão nobre quão aquele do artista que rodeado de luxo se põem a pintar, a esculpir ou a escrever, tentando comunicar uma qualquer insatisfação, seja ela para com a injustiça social ou para com a inevitabilidade biológica do ser… do meu ponto de vista…ambos são da mesma qualidade… pelo que a destacar na nossa espécie, é a forma como em todas as situações, o Homem que se sente insatisfeito procura subir mais um degrau, mesmo quando nunca ninguém o fez antes dele, e perante o passo para o desconhecido, a tenacidade nos impulsiona para a garganta da criação do meio, do método, de uma nova descoberta…

…a nobreza está na vontade que cada um tem de se descobrir redescobrindo tudo o resto.

Wednesday, April 19, 2006

- …No words about this…?

- No… not a whisper… just a glance…

Tuesday, April 18, 2006


Firmamento
(Parte 1 de 6)


Pouco antes de adormecer, a cor do céu ficou sem brilho.
Perdeu sem motivo, aquela luz ao longe que resguarda em fé um suspiro no silêncio.
Ergui-me apressadamente, confuso e incerto do que se tinha passado.
Na certeza, procurei uma razão para tal metamorfose, que explicasse porque a paz deu lugar ao negrume – ensinado pelo antigamente das histórias pequenas.
Todavia, cedo apreendi, que tal por mim vislumbrado não carece de motivo para existir, e mesmo antes desta estranha hipnose consumir por fim este novo olhar, o céu tomou novamente a sua aurora prateada para me esgazear sem motivo aparente.
Desta vez não resisti à dúvida e aceitei o que se me apresentava como seguro – pois, guindando calmamente o mistério para lá da inquietação – observei sonâmbulo o céu a aproximar-se a pouco e pouco da terra – como se de uma metáfora poética se tratasse – mas sendo verdadeiramente a graça da realidade.
Esperei perplexo que este fenómeno – origem de génios que em cerros de teorias e discussões se eternizavam – a mim apenas pertencesse; honrando todos os outros com o olhar da manhã, suspenso no triste monte da Europa… mas tal caiu por terra, quando também por terra caíram dúzias de pequenos troncos colados entre folhas e ramos, cobrindo os telhados desta vila, de pomos e outras frutas proibidas…
Teria a música do vento arrastado uma chuva de frágeis pernadas dos longínquos vales litorais até esta vila dos remotos?
A dúvida tranquilizou-me mais que a resposta… mas nenhuma delas impediu o céu de se aproximar um pouco mais da minha consciência preocupada.
No dia seguinte, que para a maioria começou quatro horas depois da minha inexplicável descoberta, poucos se aperceberam deste fenómeno, tamanho o afazer que os preocupava em não levantarem os olhos dos seus propósitos de existência. Mas a pouco e pouco – como que um drama apressando o seu fim – alguns, aqui e ali, notaram algo de diferente na sua pequena cidade. As colheitas tão castamente zeladas pelo talento de homens simples, viram no súbito cair de regras e frutos verdes antes de época, uma resposta natural para o estranho fenómeno invisível à claridade.
Imediatamente, turbas de anciões da razão postularam novas éticas, jurando pelos há muito sepultados, que a Natureza tem destas coisas…
Que a culpa de tais erros extremava sobre os ombros da juventude, por ilusões de um futuro incorrectamente pernicioso – devassado por desejos de conquista e domínio – contrários à essência do temperamento.
Roucos timbres navegando pelo vagar, irromperam assim terríveis sátiras copuladas a esses seres vindouros – uma ode ao desperdício – daqueles que namoriscando a vida com normalidade, apenas procuram o ensejo da demanda…
Mas esses expirares de poemas – impermeáveis às críticas moucas da cobiça – não travaram o encolher do sol – procurando esse agora, pequenas fendas nas alturas, para irromper como luz matinal…
E não travou igualmente, o que agora se tornava claro e evidente para todos: que as árvores – parecendo cera – cresciam pelos céus, ganhando raízes onde outrora existiam troncos – e estas – educando o firmamento, inclinavam-no sobre a terra…

Cont.

Monday, April 17, 2006


Enigma de um homem monótono

O egoísmo de criar

1

Da poeira dos tremores se fez pele do pensamento
quando esse mito, frágil, da idade do horizonte –
aqui, longe da dor, e dos ouvidos do mundo –
se perdeu por entre a prata, no firmamento.


Cresceu erecto, sédulo e encantatório,
como as leis – cujo facho é a mão de deus;
mas do templo dos segredos, pilhou apenas uma máscara,
negra, sem alívios, do funeral dos ateus.


É coro, ou as verdades que se lhe colam,
É medo – grande colosso de madeira sobre o vértice,
É decisão, é testamento – fumo brilhante da ilusão,
É o acto de não ser…
E, não há covil que o não deseje.

Friday, April 14, 2006


Há lugares no mundo assim… onde as velhas pertencem ás ruas e as ruas são histórias calçadas por mil pedaços de pedra, como uma passadeira de miúdos retalhos que estreitam à medida que subimos…